sábado, 11 de outubro de 2008

“Tudo que é sólido desmancha no ar”

Jeferson Miola
A eleição de Porto Alegre não acontece sobre uma página em branco. Porque nas duas últimas décadas, o PT e os partidos aliados da Frente Popular governaram a cidade durante 16 anos consecutivos, até 2004. E o outro candidato, que também disputa a eleição, é o atual prefeito que sucedeu o PT em 2005 e vem governando a cidade há três anos e meio.
Mesmo que o PT optasse por ocultar ou relevar a monumental evidência de que é a tradição política que mais contribuiu para definir o que a cidade é hoje, isso seria impossível. Todos os moradores de Porto Alegre com condição de voto experienciaram, em distintos graus, as administrações municipais do PT e da Frente Popular.
Os eleitores de 16 anos, por exemplo, conheceram, tiveram contacto, foram tocados ou beneficiados pelas políticas públicas produzidas por, no mínimo, 12 anos de Administração Popular. E todos os eleitores com idades a partir dos 20 anos, experimentaram todos os 16 anos de governos da Frente Popular de 1989 a 2004.
Nos governos do PT foram realizadas as principais obras infra-estruturais e viárias, de recuperação do Guaíba, de inovação do transporte público, de universalização de direitos sociais, de reinvenção cultural e de construção das maiores conquistas civilizatórias e cosmopolitas da cidade, como o Orçamento Participativo, o Porto Alegre em Cena e o Fórum Social Mundial, para relembrar apenas algumas delas.
Em diferentes níveis, planos, tempos e intensidades, o povo de Porto Alegre conhece os governos do PT e, se provocado, puxa da memória uma opinião ou expressa uma sensação a respeito desses governos. O PT faz parte da vida pública, política, cultural e administrativa de Porto Alegre; é parte constituinte da mais rica história da cidade. O PT pertence ao imaginário do povo de Porto Alegre, porque ele, mais que qualquer outro partido político, esteve diretamente envolvido com as mais importantes produções simbólicas e concretas de dezesseis dos últimos vinte anos da cidade.
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Os três primeiros mandatos da Administração Popular sempre obtiveram índices elevados de aprovação na sociedade, devido ao êxito das políticas públicas e de desenvolvimento aplicadas. Mesmo a última gestão à frente da Prefeitura [2001/2004], quando foram enfrentadas sérias restrições orçamentárias e dificuldades gerenciais, e que a população cobrou o preço pelas disputas políticas equivocadas do PT, ainda assim metade da sociedade aprovava a Administração Popular.
Não é presunçosa a constatação, portanto, de que até o mais prejudicado dos quatro governos do PT em Porto Alegre foi anos-luz melhor que o governo do condomínio conservador de José Fogaça. Com uma administração pálida, esquálida, sem realizações e sem vigor, o governo atual do município atingiu maiores índices de aprovação somente no período da propaganda eleitoral. Isso porque, durante o debate do primeiro turno, o candidato oficial navegou em águas calmas e não foi sequer contestado em relação às falácias e baboseiras ditas nos programas de rádio e televisão.
Criou-se assim uma situação sui generis, em que o candidato Fogaça obteve uma votação muito superior [43,84%] aos índices de aprovação do seu governo, que orbitavam na casa de 31% até meados do ano. O prefeito conseguiu, em três meses de campanha eleitoral, constituir uma imagem administrativa e política positiva que não havia conseguido estabelecer em três anos e meio de governo ridículo.
Com os votos e percentuais colhidos no primeiro turno pelo atual prefeito, e com a diferença aferida em relação a Maria do Rosário, seria plausível concluir-se que, para perder a eleição, o atual prefeito precisaria cometer erros graves, que não cometeu no primeiro turno. Mas também não seria absurdo supor-se que o acerto no padrão de campanha no segundo turno, de parte da candidatura Maria do Rosário, poderia alterar esta tendência então mais provável. Para o PT, na realidade, não resta outra alternativa senão mudar drasticamente a estratégia da campanha, para ambicionar vencer as eleições.
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Tenho, de maneira empírica, a convicção de que ainda seria possível – neste caso, dramaticamente possível – virar-se o jogo eleitoral com um giro radical do padrão da campanha; mesmo considerando-se a enorme dificuldade que representa virar-se os votos de quem votou no Fogaça no primeiro turno.
Um pressuposto para isso é que o voto em Fogaça nas camadas baixas e médias-baixas foi um voto sem consistência, volúvel, não-cativo, não-partidário, não-doutrinário. Um voto de tipo inercial no/do situacionismo; irrefletido, não-confrontado com a realidade. Nas alegações dos eleitores do Fogaça destes extratos sociais para justificar o voto nele, os argumentos são superficiais e, como não estão intoxicados por sentimento de ódio ao PT, naturalmente aceitam como verdadeiros os contra-argumentos que lembram que os governos do PT melhoraram a própria vida mais do que o governo Fogaça.
No exercício do voto, muitas vezes o povo não elabora sua opção cognitivamente, mas pelas influências simbólicas imediatas que recebe e registra. O voto, principalmente nas camadas mais populares, não é a resultante coerente de análises políticas sofisticadas e complexas. A presença potente de símbolos, imagens e códigos – como fez o Fogaça no primeiro turno – e a ausência de política, de contra-símbolos, contra-imagens e novos códigos – como fez a campanha do PT – favorecem quem está no governo.
Os eleitores do Fogaça, para construir uma nova razão, uma razão política consciente, precisam ser provocados a cotejar os “tempos do PT” com o governo do Fogaça. Devem ser lembrados de que nos governos do PT, “não faltavam antibióticos nas farmácias do SUS, nos plantões e nos postos de saúde”, como faltam agora. Antes do PT, se morava em becos “sem luz, sem água, sem calçamento e sem esgoto”. Antes do PT, as famílias não podiam “trabalhar porque não existiam creches para deixar os filhos”. Depois que o PT assumiu, “os passageiros passaram a ser respeitados, foram criadas novas linhas e se passou a andar em ônibus novos e confortáveis”. Foi nos governos do PT que “o Fórum Social Mundial foi criado e realizado, e depois que o PT saiu do governo o Fórum Social nunca mais voltou para Porto Alegre”.
É necessário que a campanha da Maria do Rosário promova de maneira pedagógica a confrontação das experiências concretas de governo que se desenrolaram aqui em Porto Alegre, não em Belo Horizonte ou em qualquer outro lugar do país. O patrimônio de cumplicidade e intimidade construído em dezesseis anos tem de ser evocado para a obtenção de novo voto de confiança no partido que conhece a cidade, fez bem para a cidade e que pode recuperar o papel avançado de Porto Alegre no futuro e no cenário nacional e mundial.
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Na disputa da eleição, confrontam-se projetos, programas, realizações, biografias e as alianças sociais e partidárias de cada candidatura. Com Maria do Rosário, está o campo democrático e popular autor, junto com o PT, da grande obra de construção de Porto Alegre até 2004. Com Maria do Rosário está o Presidente Lula e o potencial que a relação amistosa e companheira representa para catapultar Porto Alegre no plano econômico e social a partir das políticas virtuosas em desenvolvimento no país. Com Maria do Rosário estão a maioria dos prefeitos eleitos na Região Metropolitana de Porto Alegre, com os quais ela poderá, a partir finalmente de um ambiente regional propício e em diálogo com o Governo Lula, empreender políticas metropolitanas - na saúde, nos transportes, na educação, de emprego - que beneficiarão enormemente a população de Porto Alegre.
Ao lado de Fogaça está o pior do reacionarismo político gaúcho. Com ele estão os partidos conservadores que, nos últimos seis anos, têm destruído os avanços e conquistas cidadãs tanto em Porto Alegre como no Rio Grande do Sul. A base partidária de sustentação de Fogaça é a mesma da governadora Yeda. E eles se juntam não para fazer algo a favor de Porto Alegre e do Rio Grande; porque eles não têm planos de futuro para o Estado e sua capital. Eles sempre e somente se juntam para derrotar o PT; o plano fundamental que têm é de derrotar o PT, não é um plano de governar. Com o Fogaça está, por exemplo, o PPS do velho e manjado ex-governador Britto e sua turma, que faz oposição feroz e odiosa ao Presidente Lula. Não por acaso o principal secretário de Fogaça e Yeda, o César Busatto, “ricuperamente” sumiu no período eleitoral - logo ele que confessou em detalhes a maneira escabrosa como agem os partidos que estão com o prefeito e a governadora.
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A crítica política contundente e leal não é pecado na política, menos ainda numa eleição. Para o PT de Porto Alegre, que alcançou a condição de disputante do segundo turno eleitoral, a simples atitude propositiva não assegura a eficácia necessária para vencer a eleição. É fundamental a militância nas ruas, nas vilas, visitando casa por casa e levando a memória das realizações do PT e os projetos para o futuro. E é super essencial um combate político, simbólico e programático duro para desconstituir o atual prefeito, que faz um dos governos mais medíocres da história de Porto Alegre.
Vencer é derrotar o adversário, para isso desmistificando-o perante o povo. Fogaça soçobra a qualquer debate sério e metódico. Ele se desmancha quando confrontado com nossa experiência e a realidade. Parafraseando as palavras de Marx no Manifesto Comunista, “Tudo que é sólido desmancha no ar, tudo que é sagrado é profano, e os homens finalmente são levados a enfrentar (...) as verdadeiras condições de suas vidas e suas relações com seus companheiros humanos”.
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Dedicado ao querido Pilla Vares, um artífice e co-inventor desta generosa obra que foi a Administração Popular de Porto Alegre.

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Camarada Pilla, o mundo fica triste sem ti

Hoje o futuro, a esperança, a generosidade e os ideais de um mundo e de um homem novo perdem muito.

Hoje o Pilla, o Luiz Paulo Pilla Vares, nos deixa porque encontrou a morte. Vai com ele aquela rara consciência revolucionária, de cepa proletária e socialista. Vai com ele o entusiasmo daquele guri sempre faceiro porque crente no porvir histórico de dias ensolarados para todo o povo e para toda a humanidade do mundo inteiro!

Na sua alma grandiosa, a camaradagem, a generosidade, o companheirismo, a paixão e o amor firmaram residência. Na sua consciência arguta e histórica, os ideais libertários, igualitários e humanistas moldaram a noção de esperança no futuro.

Ele foi um dos bravos e mais valiosos do que de melhor o PT produziu e sintetizou da tradição teórica socialista brasileira dos últimos cem anos. E agora o Pilla continua sendo uma estrela; daquelas estrelas mais resplandecentes. Uma estrela que irradia os corações de quem confia que a política só faz sentido, para a esquerda, se for algo para mudar o mundo – de verdade.

Tchau, meu querido camarada Pilla! Até logo, Pilla, nos veremos num futuro melhor!

Neste dia que escolhestes para encontrar a morte - o mesmo dia que tombaram o Che, a 41 anos – não é uma metáfora, mas a representação insofismável do belo exemplo militante, intelectual, socialista e humano que fostes. Por isso te digo, meu camarada Pilla, Hasta La vitória, siempre!! Por isso grito: Pilla Vares – presente!

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Che: símbolo dum mundo novo; exemplo humanista e socialista

Em 09 de outubro de 1967, 41 anos atrás, Ernesto “Che” Guevara foi covardemente assassinado no povoado de Higuera, no interior da Bolívia.

Derrubaram Che na ilusão de que, com sua morte, a Revolução sucumbiria.

Engano: passadas estas primeiras quatro décadas, seu exemplo como revolucionário, humanista e socialista é cada vez mais e mais a certeza de que o mundo só será verdadeiramente humano com a derrota do capitalismo e com a destruição de todas as formas de opressão, discriminação e exclusão.

Viva Che!!
Hasta la vitória, siempre!!

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Dropes

Além do desastre do PSDB e da Governadora Yeda Crusius nas eleições, José Otávio Germano e João Luiz Vargas, dois dos implicados no escândalo do Detran e que tinham interesses diretos nas eleições, também se deram mal nos seus respectivos reinados. A esposa de João Luiz Vargas [JLV, como era registrado nos documentos da turma do Lair Ferst], Júlia Vargas, perdeu a eleição em São Sepé, e Pipa Germano, primo de José Otávio, ficou em terceiro lugar em Cachoeira do Sul.

No município de Teutônia, em que se apresentou um candidato único a prefeito, os resultados foram, no mínimo, desastrosos para o prefeito eleito. O novo prefeito de Teutônia, embora eleito com 49,73% dos votos, foi rejeitado pela maioria do povo teutonense, que votou nulo [47,90%] e em branco [2,36%], totalizarando 50,26% de votos contrários. A média de votos nulos, nas eleições municipais deste ano no RS, foi de 4,4%, mais de 11 vezes menos que os nulos observados em Teutônia!

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

A vitória do PT no Rio Grande do Sul - 4

A vitória eleitoral do PT gaúcho tem seus vitoriosos internos. De modo geral, o campo que compreende a “Mensagem ao Partido” é o principal beneficiário deste crescimento. Internamente à “Mensagem”, a DS é, individualmente, a principal tendência vitoriosa.

Os problemas internos do PT de Gravataí, evidenciados na ruptura entre o ex e o atual prefeito da cidade, também poderão ser benéficos para o PT. Não é demais lembrar que Gravataí, em épocas não muito distantes, pesou na balança das decisões partidárias com seus métodos que, em tempos pretéritos, seriam considerados inaceitavelmente “heterodoxos” do Rio Mampituba para baixo.

A vitória do PT no Rio Grande do Sul - 3

Os resultados eleitorais positivos do PT no Rio Grande do Sul demonstram que havia um ambiente e uma tendência potencial de vitórias para o partido em todo o estado. Por isso, o desempenho preocupante do PT em Porto Alegre exponencia o peso dos erros – ou, se se preferir - dos desacertos cometidos na condução política e eleitoral. Alguns aspectos para se refletir:

* Maria do Rosário fez 179.587 votos, correspondentes a 22,73% do total de votos válidos; percentual que é inferior a todas as participações eleitorais do PT em Porto Alegre, com exceção de 1985 [primeira eleição em capitais depois do fim da ditadura militar, quando se apresentou com Raul Pont] e do primeiro turno a governador em 1990 com Tarso Genro.
* Foram eleitos 7 vereadores do PT e outro na coligação da Frente Popular; menor bancada partidária desde 1988. Ainda assim, o PT elegeu a maior bancada individual da Câmara de Vereadores.

* O PT já não teve a maior votação de legenda nesta eleição, perdendo posição para o PMDB.

São circunstâncias extraídas do primeiro turno eleitoral que, vistas em conjunto com o alto percentual obtido pelo atual prefeito, que foi de 43,84%, informam que é essencial o trabalho árduo acompanhado de drástica mudança na condução da campanha de Maria do Rosário para a reconquista de Porto Alegre.

A desvantagem de Marta Suplicy em São Paulo obrigará o PT a adotar uma campanha mais agressiva na disputa contra os adversários do governo Lula. Quem sabe esta necessidade não seja um aspecto a influenciar a mudança de fisionomia da campanha do PT em Porto Alegre no segundo turno.

A vitória do PT no Rio Grande do Sul - 2

Enquanto isso, na cidade “gaulesa” de Porto Alegre, a principal vitória do PT foi a confirmação da ida da Maria do Rosário ao segundo turno para enfrentar o atual prefeito Fogaça. O desempenho do PT na capital, porém, exigirá um brutal trabalho de superação para vencer Fogaça e o condomínio conservador que se aglutinará em torno dele no segundo turno.

O PSOL, com os 9,22% de Luciana Genro e a eleição de duas vagas na Câmara de Vereadores, é um dos partidos que melhor se beneficiou na eleição em Porto Alegre. No contra-fluxo, o DEM e Ônix Lorenzoni diminuíram mais da metade dos votos que o candidato fez em 2004, despencando de mais de 80 mil votos na eleição para a prefeitura em 2004 para os 38 mil obtidos nesta eleição.

E para o PCdoB, a dureza foi grande: não só não se classificou para o segundo turno, como não elegeu nenhum vereador. Mas, devido à força de atração eleitoral da Manuela, o partido foi veículo para a eleição de 3 vereadores do PPS.

O PSDB da governadora Yeda, apesar de amargar o pior desempenho em eleições majoritárias em todas as eleições disputadas na capital, conseguiu eleger dois vereadores.

A vitória do PT no Rio Grande do Sul - 1

O PT é o partido que obtém a maior vitória eleitoral no RS nessas eleições municipais de 2008. Foi o partido que mais ampliou o número de municípios que governará, passando dos 43 conquistados em 2004 para 63 a partir de 1º de janeiro de 2009 – cerca de 50% de crescimento de titularidade de prefeituras municipais gaúchas. Foram vitórias importantes, que aumentam o ativo político do PT na política gaúcha e que ajudam a recompor a primazia do partido no debate público no RS.

A geografia deste desempenho eleitoral do PT começa com a “varrição petista” na região metropolitana de Porto Alegre e em todo o eixo da BR-116: Viamão, Gravataí, Novo Hamburgo, São Leopoldo, Esteio, Sapiranga, Sapucaia do Sul, Dois Irmãos. Abrange cidades-pólo e sub-pólo, como Erexim, Santa Rosa, Bagé, Bento Gonçalves. E se plasma em muitos municípios encravados bem no interior do Rio Grande.

Teve também outros 17 vice-prefeitos/as eleitos/as e, além disso, disputa em segundo turno a eleição em Canoas, Pelotas e Porto Alegre. Caxias do Sul, a quarta cidade gaúcha com mais de 200 mil eleitores, e palco de emocionantes disputas entre o PT e o PMDB, teve o resultado definido em primeiro turno em favor do candidato do PMDB, mas outra vez o PT polarizou o debate político.

Os partidos que sofreram as maiores baixas em relação à quantidade de municípios governados foram o DEM, que passará das 18 prefeituras conquistadas em 2004 para 13 nesta eleição; e o PDT, que perdeu 33 cidades administradas em relação a 2004 – passou de 97 municípios governados para 64.

A avaliação conclusiva do resultado eleitoral no RS, contudo, só depois do segundo turno em Canoas, Pelotas e Porto Alegre. E cotejada com um balanço final do resultado no plano nacional.